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quarta-feira, 29 de abril de 2015

Processo de Aprendizagem em Liderança – Post 6/2015 – Contexto 3

Vamos falar um pouco mais sobre os métodos de ensino e aprendizagem, a partir das demandas impostas pelo atual contexto do trabalho e de suas perspectivas de transformação nos próximos anos.



Li há poucos dias uma entrevista muito interessante do filósofo francês Pierre Lévy, um dos maiores especialistas mundiais em internet e em culturas tecnológicas digitais e seus impactos, publicada pelo Jornal Correio do Povo, no seu Caderno de Sábado, onde ele faz um balanço de pouco mais de três décadas de web, a teia global, o hipertexto, a navegação na rede ao alcance de todos.


Destaco alguns trechos que têm a ver com o assunto que estamos tratando.


Diz ele: “a internet se expandiu mais rapidamente do que qualquer outro sistema de comunicação na história. No começo dos anos 1990, havia 1% da população mundial conectada. Uma geração depois, já eram 40%. Avançamos rapidamente para 50% e mais… Estamos apenas no começo da revolução do meio do algoritmo. Nas próximas décadas, acompanharemos várias mutações. A computação ubíqua, que já faz parte da nossa paisagem, vai se generalizar fazendo com que a maioria esteja permanentemente conectada. O acesso à análise de grandes quantidades de dados, hoje nas mãos de governos e de grandes empresas, vai se democratizar. Teremos cada vez mais imagens de nosso funcionamento coletivo em tempo real. A educação vai se focar na formação crítica e no tratamento coletivo de dados (grifo nosso). A esfera pública será internacional e se organizará por nuvens semânticas nas redes sociais. Os países passarão da forma “Estado-nação” para constelações de Estado, com um território soberano e uma zona desterritorializada na infosfera de conexão total. As criptomoedas, moedas digitais criptografadas, vão se disseminar. Sentiremos cada vez mais, de agora em diante, a consequência disso tudo em nossas vidas cotidianas. Depois do surgimento da web, na metade dos anos 1990, não houve grande mutação técnica, somente uma profusão de pequenas evoluções e progressos. No plano sociopolítico, o grande salto me parece ser a passagem de uma esfera pública dominada pelos jornais, pelo rádio e pela televisão para uma esfera pública centrada nas “wikis”, nos blogs, nas redes sociais e nos sistemas de moderação de conteúdos onde todo mundo pode se exprimir. Isso significa o começo do fim do monopólio intelectual dos jornalistas, dos editores, dos políticos e dos professores. Um novo equilíbrio ainda não foi alcançado, mas o velho sistema dominante está em franca erosão”.

E mais especificamente sobre as oportunidades de aprendizagem em sistemas de cooperação: “Falo em inteligência coletiva para enfatizar e estimular o aumento das capacidades cognitivas em geral, sem fazer juízo de valor. Refiro-me ao aumento da memória coletiva, ao crescimento das possibilidades de gestão e de criação de redes e das oportunidades de aprendizagem em sistemas de cooperação, com acesso universal a informações e dados(grifo nosso).

Acredito que esse aspecto é inegável e que todos os atores intelectuais e sociais responsáveis deveriam utilizar essas novas possibilidades na educação, na gestão do conhecimento, nas empresas e nas deliberações políticas democráticas (grifo nosso). É preciso inserir a internet na longa série que passa pela invenção da escrita e do impresso”.


Estas profundas transformações que estão ocorrendo na sociedade pedem novas formas - métodos - de lidar com o ensino e a aprendizagem. As tradicionais maneiras de ensinar e aprender ainda predominam nas instituições voltadas à educação, tanto de crianças como de adultos. Mas já vemos os sinais do novo método chegando e, muito provavelmente, daqui a alguns anos predominando no cenário.


A expertise em aprender é tão importante que um grupo de estudiosos de vários países sugeriu a criação de uma nova área de estudo, a Heutagogia. A grande distinção feita por Knowles entre o aprendizado do adulto e o aprendizado da criança sem dúvida foi um marco fundamental no contexto da educação executiva (T&D). Mas outra grande transformação no ambiente está acontecendo.  A disponibilidade e rapidez com que temos acesso à informação impõe a necessidade de habilitar os profissionais com meios e conteúdos para questionar e produzir conteúdos sem restrições e de maneira livre e responsável. A Heutagogia, apropriando-se dos conceitos da Pedagogia e da Andragogia, vai além, buscando estruturar uma forma das pessoas “aprenderem a aprender”, um desejo já presente nas ideias que formataram a jovem/velha Andragogia.


No próximo post, vamos falar um pouco mais sobre este novo método de aprendizagem. 

quarta-feira, 15 de abril de 2015

Processo de Aprendizagem em Liderança - Post 5/2015 - Contexto 2

A pergunta importante sobre o contexto é: as organizações aprendem?

Já faz um bom tempo que esta questão preocupa os estudiosos e teóricos das organizações. Por volta do final dos anos 70, dois pesquisadores e autores, Chris Argyris e Donald Schön (Organizational Learning - A theory of Action Perspective), afirmavam que as organizações ‘não aprendem’, que na verdade isto não passava de uma metáfora.

Como nos diz Antonio Carlos Valença, no capítulo 10 - Aprendizagem Organizacional de seu livro Mediação (2007), citando os dois autores acima: “Diz-se que as organizações aprendem ou deixam de aprender. Para os dois autores, no entanto, um exame mais apurado dessas maneiras de falar sugere que esses termos são simples metáforas. Literalmente, as organizações nem se lembram, nem pensam, nem aprendem. São as pessoas nas organizações que pensam, lembram, aprendem. É preciso dizer o que se quer comunicar com o significado de uma organização agir e mostrar como a ação organizacional é, ao mesmo tempo, diferente e conceitualmente ligada à ação individual. É fundamental esclarecer as metáforas da memória, inteligência e aprendizagem nas organizações. Faz sentido dizer que as organizações literalmente aprendem? Na opinião dos dois autores da aprendizagem organizacional, sua real compreensão requer que se decifrem as condições e processos. ‘As organizações podem ser vistas como coletividade que aprendem, enquanto e tão somente os indivíduos que as integram aprendem ou pelo menos boa parte deles aprende’.”

De fato, há muito tempo tenho compartilhado desta crença e acredito que as organizações são abstrações jurídicas e só ganham vida por conta das pessoas. São elas que lhe dão origem e finalidades, concebem e organizam suas realizações, estabelecem e produzem seus resultados e a fazem sobreviver e se desenvolver no ambiente de sua atuação e, finalmente, administram e lideram outras pessoas que a ela emprestam suas energias.”

Numa linguagem mais comum podemos dizer que a abordagem pressupõe que cada componente da organização, em especial a pessoa, representa uma unidade singular e única, ao mesmo tempo em que faz parte de unidades maiores - grupos, setores, departamentos, divisões, também singulares e únicas, interdependentes e dinamicamente se inter-relacionando, com finalidades relativamente semelhantes e complementares, para alcançarem resultados. A organização é um fenômeno social por excelência.

Assim, é um sistema complexo, interdependente e aberto, composto por quatro dimensões distintas - identidade, relações, processos e recursos - originado na própria sociedade e formado por vários subsistemas (que por sua vez também são complexos, interdependentes e abertos), com capacidade de ações e reações próprias e diferenciadas, que lhe confere singularidade e potência para realizar suas finalidades e sobreviver ao longo do tempo, no ambiente de atuação.

Neste particular é que vale a pena destacar o papel fundamental da aprendizagem, pois ela está profundamente ligada à necessidade de sobrevivência da organização. O aprendizado ocorre nas pessoas, que ao disponibilizarem este aprendizado em ações no ambiente organizacional, mediante o exercício de seus papéis, possibilitam o aprendizado organizacional que se mostra por padrões de condutas muito semelhantes que dão caráter e identidade àquela organização (sua cultura) - uma comunidade que compartilha valores comuns, que assume as mesmas atitudes coerentes frente aos acontecimentos e que tem nas ações de seus membros grandes semelhanças (não podemos e nem queremos igualdade de comportamentos das pessoas).

A aprendizagem é essencialmente individual - as pessoas aprendem por conta de seus interesses, motivações, estímulos e capacidades. Ao praticarem suas ações nos ambientes organizacionais, estão, de certa forma, disponibilizando seus aprendizados e compartilhando com as demais pessoas da organização. Neste particular, vale destacar a importância do exercício do papel da liderança para o aprendizado coletivo das organizações.

As ‘organizações que aprendem’ como diz Peter Senge, logo no início de seu livro ‘A Dança das Mudanças - Os desafios de manter o crescimento e o sucesso em organizações que aprendem’ decorrem de “uma capacidade de aprendizagem coletiva” o que significa dizer que elas possuem um comprometimento compartilhado para a mudança decorrente de sua disposição de gerar aspirações comuns e compartilhadas.

Senge ainda enfatiza em outro trecho do livro “desenvolver capacidade de aprendizagem no contexto de grupos de trabalho e metas reais do negócio pode levar a processos poderosos de estimulação do crescimento - este tem sido o principal foco da ‘criação da organização que aprende’ nos últimos vinte anos”.


Acredito que as organizações que realmente dão importância ao aprendizado de seus funcionários, em especial de seus líderes, são aquelas que entendem a aprendizagem como um valor organizacional e assumem uma atitude coerente, decidindo por disponibilizar recursos adequados para investir em sistemas, processos e métodos que facilitam ações de formação, treinamento e desenvolvimento de suas pessoas, de forma contínua e permanente, apesar de conjunturas mais ou menos favoráveis.

quarta-feira, 1 de abril de 2015

Processo de Aprendizagem em Liderança - Post 4/2015 - Contexto

Em qual contexto se dá o aprendizado do adulto?

Inicialmente é bom deixar claro que a disposição para o aprendizado, tanto na criança como no adulto, é uma disposição natural e, pelo que até hoje se sabe, fundamental para a própria sobrevivência. Assim, de maneira geral, as pessoas querem e precisam aprender.

Este aprendizado começa desde o momento do nascimento e se prolonga até o final da vida. O contexto onde ele corre é múltiplo, variado e tem a ver com as experiências de cada pessoa, nas diferentes fases de sua vida.

Ao olhar este caminho de aprendizado na perspectiva biográfica, vamos identificar que as três primeiras fases da vida (os três primeiros setênios) são consideradas como o período marcado pelo impulso do aprendizado. Não que nas demais fases da vida deixamos de aprender, ao contrário, continuamos a aprender sempre, mas outras tarefas se mostram como maior intensidade. As influências neste período podem ser bem caracterizadas e até mesmo mapeadas, caso haja interesse. Assim, resumidamente temos:

Fase da Vida
Período
Fonte de Influência e Aprendizado
Primeira Fase
0 - 7 anos
A família é centro de referência. Quase tudo aprendido por imitação.
Segunda Fase
8 - 14 anos
A escola e professores são referência. Boa parte é apreendida por dedicação aos estudos.
Terceira Fase
15 - 21 anos
A família, a escola, os amigos, colegas de trabalho passam a serem referências. Tudo que é apreendido tem a ver com interesses pessoais e necessidades.


Constata-se que grande parte de nossa identidade é construída nestes três primeiros setênios da vida e, portanto, pelo aprendizado que tivemos. Na fase adulta, reconstruímos e refazemos nossa maneira de ser em vista das demandas do ambiente e da experiência que adquirimos com a vida. 

É bom considerar que neste período inicial da vida, aprendemos também sobre as ‘experiências de aprendizado’, o que, de certa forma, orientará a disposição que teremos para as futuras situações de aprendizado na fase adulta da vida.

Mas, ao lado destas disposições internas, temos todas as diversas e múltiplas condições presentes no ambiente em que vivemos e atuamos. Elas caracterizam o que podemos chamar de contexto.

Por vezes, estas condições são tão fortes e mandatórias que superam as nossas preferências individuais (disposições internas). Cabe aqui uma perspectiva mais geral sobre o atual contexto que estamos vivendo, e vamos dar ênfase no contexto profissional, para nos mantermos no tema proposto.

“A evolução do contexto de trabalho - novas tecnologias, novas organizações de trabalho, gestão, fluxos, transversalidade - induz uma elevação do nível de profissionalismo e uma recomposição das funções. A polivalência, a multifuncionalidade e a capacidade de cooperar adquirem cada vez mais importância. Uma ‘economia da variedade’ está se desenvolvendo. Diante das exigências incessantes de renovação e de adaptação dos produtos e serviços, e da necessidade de inovar, torna-se indispensável renovar os conhecimentos e as competências, colocando-se em situação de aprendizagem permanente”. (Extraído do livro Desenvolvendo Competências dos Profissionais - Guy Le Boterf).

“Diante das mudanças esperadas em tecnologia, biologia, medicina, valores sociais, demografia, no meio ambiente e nas relações internacionais, com que tipo de mundo a humanidade poderá se deparar? Ninguém pode afirmar com certeza, mas uma coisa é razoavelmente certa: contínuos desafios irão convocar nossa capacidade coletiva para lidar com eles. Deixar de repensar nossas empresas pouco nos aliviará das dificuldades que enfrentamos hoje: crescente turbulência a nos causar pressões cada vez mais intensas; crescente falta de integração e forte competitividade interna; as pessoas trabalhando mais, em vez de aprenderem a trabalhar mais racionalmente ... Nós somos limitados ao abordar essas questões pela nossa capacidade de aprendizagem coletiva...”. (Extraído do livro A Dança das Mudanças - Os desafios de manter o crescimento e o sucesso em organizações que aprendem - Peter Senge e outros).

Nesses extratos, de autores consagrados sobre o tema aprendizagem, notamos que o contexto e sua evolução para os próximos anos indicam que será de contínuas e aceleradas mudanças. Tal constatação impõe para todo profissional a necessidade de mudanças e, por decorrência, de aprendizados de novas formas de pensar, sentir e agir no ambiente profissional.  Mas fica claro, também, que existem dois tipos de demandas e elas estão interagindo neste contexto. Temos aquelas que estão diretamente ligadas a aprendizagem individual do profissional e aquelas que estão presentes como necessidades coletivas do ambiente organizacional.

No próximo post vamos continuar falando sobre este contexto e das necessidades de aprendizagem que ele traz para os líderes.