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quarta-feira, 24 de abril de 2013

Valores, Crenças, Atitudes e Comportamentos (terceira parte)

Vamos retomar o tema, relembrando rapidamente o texto anterior.

Vimos que todos nós, ao longo do processo de crescimento e educação, aprendemos que nem sempre podemos falar aquilo que realmente acreditamos. De fato, aprendemos a adotar uma série de “condutas sociais” que evita expor as próprias crenças e não enfrentar as consequências tão negativas caso as tivéssemos revelado. Esta habilidade de disfarçar, mudar de assunto ou mesmo de se omitir frente a situações embaraçosas ou que possam trazer implicações negativas para o alcance dos objetivos desejados, é desenvolvida e aprimorada desde a primeira infância.

Recomendo a leitura do livro “Por que Mentimos – Fundamentos Biológicos e Psicológicos da Mentira”, de David Livingstone Smith, muito interessante e que pode ajudar a ter uma compreensão mais ampla sobre esta ‘habilidade de enganar ou mentir’. Diz ele no trecho inicial do livro:

“O engano é, e provavelmente sempre foi, uma grande preocupação da cultura humana... Temos falado, escrito e cantado a respeito do engano desde que Eva disse a Deus: ‘a serpente me enganou, e eu comi’...” 

“Nosso aparentemente insaciável apetite por histórias de enganos vai de um extremo a outro da cultura, desde Rei Lear até Chapeuzinho Vermelho... Esses contos são cativantes porque falam de algo fundamental na condição humana. O engano é uma dimensão crucial de todas as associações humanas, sempre à espreita nos bastidores dos relacionamentos entre pais e filhos, maridos e esposas, empregados e empregadores, profissionais liberais e seus pacientes, governos e cidadãos. A mentira é obrigatória devido à sua própria natureza, para cobrir rastros, pois, para mentirmos de maneira eficaz, temos de mentir sobre o fato de mentir. Isto representa um problema para qualquer um que esteja querendo provar a onipresença do engano... Apesar de afirmarmos que valorizamos a verdade acima de tudo, também temos ao menos uma obscura consciência de que há algo de antissocial na franqueza em excesso... Eu defino a mentira como qualquer forma de comportamento cuja função seja fornecer aos outros informações falsas ou privá-los de informações verdadeiras. Mentir pode ser um ato consciente ou inconsciente, verbal ou não verbal, declarado ou não declarado. Pense por um instante em todas as formas de desonestidade que não requerem o uso das falsidades verbais explícitas: implantes de seios, apliques, doenças fictícias, orgasmos fingidos e sorrisos falsos... De acordo com o folclore do engano, pessoas comuns, decentes, mentem apenas de forma ocasional e irrelevante... O engano nos persegue do nascimento até a morte e penetra em todos os aspectos de nossas vidas pública e privada. A maioria de nós diz que ensina os filhos a não mentir. Embora seja verdade que as crianças ouvem que não devem mentir, aprendem mais frequentemente a mentir de uma maneira socialmente aceitável.”

“Os adultos ensinam as crianças a enganar por meio de exemplos, enganando-as com ‘canções de ninar, promessas, desculpas, histórias para dormir e ameaças sobre os perigos do mundo’... À medida que envelhecemos nosso talento para a dissimulação se torna mais aperfeiçoado... No mundo dos negócios, é difícil imaginar a indústria da publicidade sem ele. A desonestidade quase calculada dos políticos é lendária...”

O que tem isto a ver com crenças e valores? Bem, para mim tem tudo a ver. Vejam como é difícil identificar os verdadeiros valores e crenças das pessoas, na medida em que isto só é possível através das inferências que fazemos a partir de seus comportamentos! Não raro estes comportamentos estão falseando as verdadeiras crenças e intenções das pessoas, e nossa percepção está captando uma ‘mensagem enganosa’ e considerando-a como verdadeira.

Mas voltemos aos nossos personagens da primeira parte, vocês se colocaram no papel deles? Vamos ver as possíveis reações que eles tiveram.

Para Antonio, no momento em que ele vai se encaminhando para falar com o chefe, pensa melhor e analisa que é mais provável que seu chefe não goste do ‘feedback não solicitado’ que ele está para dar e, aos invés de falar as ‘verdades’ que queria, desconversa e até mesmo o elogia por algum outro aspecto de sua conduta. Implicações de seu comportamento: nenhuma consequência. Seu chefe continua achando que ele é um cara legal e promissor. No entanto, lá no fundo, continua achando o chefe um cara autoritário, que não gosta de ser contestado e muito menos de receber feedback. 

José, antes de falar com os parentes, informa para a mulher das suas intenções de mostrar a eles o incômodo que suas visitas causam. Qual não é sua surpresa ao ver a reação de sua mulher em não concordar com sua ação e aceitando os incômodos que por vezes eles causam. José volta atrás e absolutamente deixa a coisa do jeito que está e esquece o assunto. Implicações de seu comportamento: evitou uma grande ‘briga’ com a mulher, o que seria muito ruim para o relacionamento deles, mas vai ter que suportar as visitas dos parentes que continuarão a acontecer.  
 
Carlos, no momento em que estava organizando a agenda para falar com cada um dos seus subordinados, reflete um pouco mais e percebe que talvez esta sua conduta possa ser muito mal recebida. Alguns poderiam se sentir assediados moralmente e, até mesmo, fazer uma reclamação junto ao RH da empresa. Carlos fica num dilema, por um lado precisa apontar as deficiências, mas por outro precisa cuidar com bastante habilidade de sua própria reputação junto à equipe e na própria empresa. Implicações de seu comportamento: como não tomou nenhuma ação imediata, acha que precisa pensar numa estratégia mais adequada, provavelmente envolvendo o pessoal do RH, e ser muito claro no processo de comunicação com a sua equipe.    


No próximo texto trataremos do tema das crenças. 


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